tag:blogger.com,1999:blog-62185672413374018782024-03-07T23:20:08.521+00:00Cova do SonoDe onde se ouve o som das ondas, o bater na rocha e o regresso ao mesmo marcovadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.comBlogger15125tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-38802865919112391652007-08-20T10:56:00.000+00:002007-08-20T20:22:26.666+00:00A brisa do Nilo<div align="left"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiJV3XiCT3RZerVAyuSNrbb1sBsTydPDsDyqW03brLPct_YyjLQKu-dFVHJS4F2dxbZJ8HM3MOuWpTJEYlgBcSWaNAeGGioYHHFDqyCQptepAFmT8MmX95n5GsYYzCsSzoHeKrWxHbV-CpW/s1600-h/grupo.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5100736559778243842" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiJV3XiCT3RZerVAyuSNrbb1sBsTydPDsDyqW03brLPct_YyjLQKu-dFVHJS4F2dxbZJ8HM3MOuWpTJEYlgBcSWaNAeGGioYHHFDqyCQptepAFmT8MmX95n5GsYYzCsSzoHeKrWxHbV-CpW/s320/grupo.jpg" border="0" /></a> </div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong> </div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;">Cairo, Agosto de 2007</span></em></strong></div><div align="center"> </div><div align="center"></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"></div><div align="center"><strong><em><span style="font-size:85%;"></span></em></strong></div><div align="center"></div><div align="center"></div><div align="left"><span style="font-size:130%;">Enquanto a madrugada começa e a Lua já vai alta, prata com toque dourado, as famílias estacionam os carros nas pontes largas que saltam o rio, estendem-se em círculos ao longo da berma e vão molhando o pão “aish” no molho de amendoim. Sentam-se no miradouro improvisado e assim ficam um bom par de horas, porque finalmente é de noite e querem sentir a primeira brisa do dia, o leve sopro refrescado por este Nilo que lhes deu tudo, até o pretexto para a reunião. Come-se, fuma-se, fuma-se muito mas também se fala, está-se, é-se, depois de mais um Sol-a-Sol infernal, caótico e quente neste Cairo de Agosto capaz de colar qualquer pedaço de tecido ao corpo – o contrário não seria normal. É a cidade gigantesca dos prédios inacabados, do trânsito insuportável, dos miúdos que queimam tabaco agachados junto aos montes de entulho, dos velhos de face vincada e das crianças que descem à margem por um braçado de verduras; é a cidade dos afluentes/esgotos a céu aberto, onde se depositam os cadáveres dos burros, ou dos clubes ricos onde orquestras gigantescas embalam, para uma dezena de endinheirados, a dança de jovens tão belas quanto misteriosas – serpenteiam braços e tronco enrolando-se sobre si próprias mas libertam os cabelos negros, lisos, irrepreensíveis, como se prometessem uma explosão que nunca se dá. </span></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-9254469593257831422007-07-24T00:55:00.000+00:002007-07-24T01:05:26.714+00:00Grande sorte, esta<div align="center"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhR5z6XP9wi066LrQlKgZW86ajVDjsWLTle7Gu7gGbHva4tFdrG8i_I-3tmEe11NVIRN0zwbsoFFiHpHLq7xPmhbuahiXU02gfqPPieaybnhEhyJb2jH6JgfhveLJPveCN-8naJfI3GWxxl/s1600-h/Nova1.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5090561857037801714" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhR5z6XP9wi066LrQlKgZW86ajVDjsWLTle7Gu7gGbHva4tFdrG8i_I-3tmEe11NVIRN0zwbsoFFiHpHLq7xPmhbuahiXU02gfqPPieaybnhEhyJb2jH6JgfhveLJPveCN-8naJfI3GWxxl/s320/Nova1.jpg" border="0" /></a><br /><strong><em>Baleal, Junho de 2007<br /></em></strong><br /><div align="left"><span style="font-size:130%;">O vento deixa de soprar do lado da ilha, ganha vergonha ao momento, recolhe-se para o valorizar. A baía torna-se lisa, ordenada, está apenas mais um simpático francês na água e lá fora, apesar de ser Junho, não há quase ninguém, dois ou três pescadores de cana na mão, um corredor no areal aberto pela maré vazia. Absoluto espectáculo, aqui as nuvens carregadas e negras, lá ao fundo um poente limpo e pintado com as cores que explodem do Sol; aqui a ameaça de trovoada, lá à frente o céu aberto e imaculado como se nunca tivesse sido voado; aqui em cima desenha-se um inacreditável arco-íris, no horizonte encerra-se um derradeiro brilho ao lado da Berlenga. Grande sorte, esta, a de existir num Mundo por vezes perfeito. </span></div></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-13949735872304566132007-06-28T00:39:00.000+00:002007-06-28T00:42:16.859+00:00O Chapéu<span style="font-size:130%;">A face fazia-se de traços finos e sérios, magros, serenos, desenhados debaixo de um chapéu preto de feltro jamais ausente. Nunca subia muito a testa, estava sempre cuidadosamente arrumado e um nada inclinado à frente e à esquerda, cerimonioso, nunca excêntrico, elegante, derradeiro toque de dignidade numa pessoa que já era tudo isso. A dignidade tem-se todos os dias e, assim, havia sempre chapéu, o que acompanhava o fato escuro e o sapato preto, do domingo, e o outro da semana de trabalho, para a camisa e a bota escura. Era o da missa das 10:00 e o dos dias em que o cereal lhe escorregava entre os dedos, felicidade aos pombos esquecidos de voar, empoleirados pelos ombros e braços. Dignidade… dizem que foi sempre assim naqueles 90 anos, vistos por uns, contados para outros, e agora, depois de ter vivido de tudo na vida, Zé Pedro também já vive na morte e ninguém lhe consegue imaginar o chapéu inclinado fora da cabeça, enquanto pega no pião esculpido à navalha e o faz girar na palma da mão, como se lhe desse existência. Obrigado por me deixares aqui à roda.</span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-42117803926573291722007-05-31T00:32:00.000+00:002007-06-09T13:56:31.340+00:00Bond, grande bond<img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5070517483911629442" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 243px; CURSOR: hand; HEIGHT: 194px; TEXT-ALIGN: center" height="184" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjwxF2wuS_y3ZpiRU3M9HOSVLCRPKjRJmqOc41u43O_hcUfGC7JEjkVioeoYtK3NwHbfVeDZI9fYpCim3daOHcRwPxMQQAvaViEOqjeuPr9vXvK5sNCvENLGbwsBBsn0aM0KwfCNEw0BN_3/s200/IMG_1534.JPG" width="223" border="0" /><br /><div align="center"><span style="font-size:85%;"><strong><em>Toronto, Maio de 2007</em></strong><br /></span></div><div align="left"><br /><span style="font-size:130%;">Foi como se cada minuto perdido fosse um desperdício demasiado valioso. Foi por isso que aproveitaram todos, os minutos e até os segundos, porque mesmo antes da despedida já ambos sabiam que tudo iria saber a pouco, demasiado pouco, ou ao nada que os gelou no momento do adeus. Há relações assim, inexplicáveis, assentes num “bond” que se vive mas não compreende; ele existe, está lá, numa palavra inesperada que é a razão ou num silêncio surdo que diz muito; num sorriso genuíno que é toda a felicidade ou num olhar profundo que serena uma vida. Bond, grande bond.</span></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-31516686935993491902007-05-09T00:14:00.000+00:002007-06-09T13:56:47.955+00:00O "fintabolista"<div align="center"><em></em><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5062349444550833554" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" height="219" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhVJQyHzIYhqlE1fInZHE1EgQHvFa4XGpQ8EBypBu-C6l0eL3IDTTzdPLF6mjVagFjO4mFdMBy66GhDTjk2_2OKvHEayruhUAkMUSMdjU9Z1Eky1GJrPaU-IJJj1huLW3AdYE2flpPM3s1W/s200/Mo%C3%A7ambique+002.jpg" width="169" border="0" /><em><strong><span style="font-size:78%;">Machava, Maputo, Maio de 2006</span></strong></em> </div><div align="center"></div><div align="left"><br /><span style="font-size:130%;">O velho parece a parede, triste, negro e parado. Não larga a posição, pernas eternamente cruzadas, pregado perante os deuses que lhe passam à frente. Deve achar que são mesmo deuses, porque não ousa sequer olhá-los nos olhos apesar de os ter ali mesmo, a dois ou três metros. Ao contrário de outros, não delira e todo ele é devoção e silêncio, a forma mais nobre de admiração. Os anos atravessaram-lhe o corpo e deve estar agora a realizar um sonho de <em>mufana, </em>quando era apenas<em> </em>um <em>fintabolista</em> e repetia no pó da terra o que o vizinho da Mafalala andava a fazer pelo Mundo. Mas todo ele é devoção, silêncio, a forma mais nobre de admiração.<br /></div></span><span style="font-size:130%;"><div align="center"><br /><span style="font-size:100%;"><em>Ninguém pode imaginar a pequenez da minha cidadezinha. Lá, porém, há gente que me dá os bons dias</em> (in Mia Couto, Contos do Nascer da Terra)</span> </span></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-71010841558995818632007-04-17T01:12:00.000+00:002007-04-17T01:51:09.489+00:00A cama 13<span style="font-size:130%;">É sempre o mesmo quarto e é sempre a mesma cama, a cama 13, aquela onde te deitam junto à janela. Não ligas nada a isso do 13, sei, e às vezes até penso que tens sorte, porque estás à janela, e vês o Sol e as nuvens, e o dia e a noite... sei lá, penso, nada melhor do que ver a vida lá fora para nos mantermos agarrados a ela!</span><br /><span style="font-size:130%;">Agarro-te a mão, não me olhas, não me falas, agarro-te a mão branca e fina e aperto suavemente porque quero que me sintas, que estou contigo e te quero comigo, e tu deixas-me esses dedos estendidos nos meus, porque se calhar não podes ou não queres agarrar-te a nada, nem a mim nem à vida. </span><br /><span style="font-size:130%;">Dói, a dor pisa-me cá dentro... mas o que quero eu? Tudo isto é egoísmo, como posso reclamar a tua presença, fazer-te refém para minha felicidade, prender-te a esta existência apenas tua, quando nem sei o que sentes, o que te dói, onde estás ou para onde queres ir?</span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-54588052629248531042007-04-03T01:19:00.000+00:002007-06-09T13:58:27.619+00:00Daqui da varanda<span style="font-size:130%;"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5049006618413526402" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" height="174" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi7NM_lkoHbvS-_t4PQwN0rgjpnu_8HAk8EwTyQ0W6BsnOS0E_DGZNQC8hxpWrcrbQCk5fv7dxjosTOABI0RrGKwxDkH65A1sC4teCznEqiG3BkWXs3NRxof6tqyNyKI_WZN0dxHRTLR0vq/s200/IMG_0623.JPG" width="230" border="0" /> </span><br /><div align="center"><strong><em>Barcelona, Julho de 2006</em></strong></div><span style="font-size:130%;"></span><br /><span style="font-size:130%;">É um terceiro andar modesto mas nobre, na forma como </span><span style="font-size:130%;">se empoleira para a cidade e olha o mar. Esqueço os quartos e a sala, o meu espaço preferido é este, a varanda, onde me sinto oferecido de bandeja à manhã fria a iluminada que há pouco se levantou ali atrás do Mediterrânico. Parece que a posso tocar, a água, quero tomar aqui todos os pequenos-almoços da minha vida, forçar os meus olhos ao choque de luz que me desperta e faz querer viver cada segundo deste dia, que se calhar nunca mais se repete.<br />Há varandas com Sol em todo o lado mas aqui tenho esta sensação feliz… sinto mesmo que faço parte do Mundo; ou que o Mundo quer fazer parte de mim. Levo os olhos do horizonte até Montjuic, salto os dois picos da Sagrada Família e percebo o buraco da Praça da Catalunha. Daqui de cima até entendo como tudo se fecha lá em baixo na cidade velha.<br />Mas não chega. Desço as escadas e a colina, faço do Parque Güell mais um breve miradouro e lanço-me finalmente em Barcelona na esperança de descobrir tudo. Como se fosse possível. Fujo às ruas novas traçadas a regra e esquadro e é na confusão do velhinho Born que me sinto alegremente desorientado. Aqui nada se procura porque mais cedo ou mais tarde tudo se encontra. Até eu me encontrei.</span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-34596995372014279882007-01-24T22:18:00.001+00:002007-01-24T22:25:34.570+00:00Vista para o tecto<div align="justify"><span style="font-size:130%;">Todo o tempo do mundo, o infinito a olhar um tecto primeiro opaco mas, bem visto, um desfilar imenso de projectos, desejos, ambições. Só assim se pode combater o relógio calão cravado na parede, a converter os sonhos em alimento da própria existência, a fazê-los desfilar como se acelerassem a cura ou o resgate desta prisão.<br />A noite cai. A luz que sobra de Lisboa atravessa as grades da janela e desenha-as na parede do outro lado. A jaula está agora completa, mais fechada. Nesta hora escura e de solidão, só mesmo o que surge no tecto permite a chegada tranquila do sono, até adormecer e percorrer o caminho mais curto até à manhã.</span></div><div align="justify"><span style="font-size:130%;">Oxalá dormisse mais. Ao início do dia, num quarto de hospital, já não há nada para fazer. António conta as histórias de como carregou ferro e cimento, ergueu prédios e os filhos; Alfredo fala pouco e gasta as energias a telefonar a alguém; e Alcino não abre a boca, apenas desce a mão pesada e lenta entre a testa e a face, como se aquilo fosse uma forma de suspiro. Não pára de suspirar todo o dia.</span></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-38781465698284204242007-01-01T01:56:00.000+00:002007-01-02T00:31:58.261+00:00Tempo<span style="font-size:130%;">Não lhe sai da cabeça. Não consegue uma trégua do pensamento invasor, não esquece os minutos horas dias, a existência sempre em função desse maior dos opressores, o tempo, castrador afiado dos sonhos marcados para a vida.<br />Olha os planos, do passado, e tudo se lhe oferece em frustração, porque o que vê é apenas espaço onde já não toca, onde mais nada se realiza; e é isso que lhe dói, não lhe sai da cabeça, no momento em que rola pela estrada vazia, e as luzes furam a noite fechada, e os quilómetros passam como o… tempo, como algo que nunca mais poderá viajar.<br />Conduz atropelado pelo sentimento, o de não estar à altura para se guiar no mundo à sua frente; sente que falhou e vasculha desesperadamente memórias, busca concretizações, vitórias que combatam a desilusão gritada no interior. E insiste até encontrar um motivo de orgulho, ou uma amizade, ou mais… até voltar a sorrir ao tempo, sentir que o controla, que o pode parar... assim como estaciona no local de destino. </span><br /><span style="font-size:130%;">Chegou ali para celebrar 2007, ergue-lhe o copo de frente e coloca-o onde deve - fora da cabeça.</span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-43619683955838760042006-12-26T12:40:00.000+00:002006-12-30T00:38:50.283+00:00Uma noite de NatalPensava-se que o almoço tinha caído mal, mas era algo mais do que isso. Visão desfocada, raciocínio afectado e sem equilíbrio para andar, José seguiu numa ambulância para o Hospital de Peniche onde, após um “Raio-X” e observação do médico… logo teve alta. Foi preciso o velhote de 88 anos tentar andar e não conseguir para o “sapateiro” – designação que José usa carinhosamente para todos os que andam com a bata branca – se lembrar de mandar fazer outro exame, um TAC. Onde? Só em Lisboa.<br />E assim viu a tarde ir passando, deitado numa maca, à espera que o levassem para Santa Maria. A única ambulância disponível tinha saído, transferindo uma jovem acidentada para as Caldas da Rainha - o Hospital de Peniche, como muitos outros pelos País, é um entreposto de casos graves: ninguém lá para; todos se transferem. Havia então a espera. “Há outras ambulâncias mas os bombeiros não têm condutores”, justificaram.<br />Ao final da tarde, por volta das 19 horas, lá seguiu rumo à Capital. José começou a constatar que o jantar de Consoada, em família, poderia estar em perigo. Confirmou que ia falhar as couves e o bacalhau quando deu entrada numa sala de espera, onde se aguardava para outra sala de espera, a dos TAC’s. Quando às 22 horas lá entrou, viu tanta gente que percebeu que nem as prendas poderia abrir.<br />Tinha Jesus nascido há 5 minutos quando o José fez o exame. Faltava agora a consulta do especialista e, é claro, também para isso foi preciso esperar. Foi então que a sua maca, empurrada pelos corredores gelados de Santa Maria - longos, sombrios, húmidos, com a tinta a cair das paredes e saudáveis bolores negros nos tectos - foi estacionada numa outra sala: Duas filas ordenadas em função do fundo, bem encostadas, e cabiam lá uns dez azarados. Quinze, juntando quem estava nas cadeiras de rodas.<br />O tempo nunca correu depressa num hospital, muito menos na noite de Natal. Queixando-se de dores na perna, na mesma que não o deixava andar, José suspirava pelo “sapateiro” quando finalmente, às duas da manhã, foi chamado e guiado para uma nova área. A maca ficou num corredor, junto a uma porta de onde saiu uma “sapateira”, mais doente do que muita gente que por ali andava. Pobre mulher, entre o tossir e o funganhar, pediu para esperar por um colega. O especialista chegou. Olhos breves no exame, atira de pronto o diagnóstico: “AVC”. Sempre no corredor, destapa o José e testa a sensibilidade da perna e braço direito. O caso, delicado, não parece de gravidade extrema. E o doente recebe ordem de transferência para Peniche, onde ficará internado.<br />Tudo demorou uma eternidade, apenas a observação do médico foi um relâmpago. Voltemos portanto à normalidade e à sala de espera onde José está novamente arrumado, agora à espera de uma ambulância que o faça regressar a Peniche. Azar dos azares: só há uma e saiu há minutos para… as Caldas da Rainha. Passaram doze horas desde a trombose e o velhote está a fazer uma directa a oitenta quilómetros da enfermaria onde será internado. Não consegue pregar o olho e pergunta de quem são os gritos que vêm do lado… a situação começa a viver-se num conformismo quase sarcástico: todos sabem que não podem fazer nada; todos rogam pragas a toda a gente.<br />Um episódio cómico anima a noite. As televisões estão na Urgência e fazem a habitual reportagem da noite de Natal. Os responsáveis dizem que tudo está a correr dentro da normalidade, que não há muitos doentes e, por isso, a espera não é longa. Conceitos. Às 06:30 da madrugada a tal ambulância que foi às Caldas, já regressada, arranca de Lisboa para Peniche, levando o José e um outro doente. Em terra, a chorar, fica uma senhora de Abrantes, alguém que sentiu-se mal e decidiu ir ao entreposto lá da terra. Acabou em Santa Maria, à espera de uma ambulância, desde a meia-noite.<br />A viagem segue tranquila, pela A8, até ao inacreditável momento em que o condutor decide parar na área de serviço de Torres Vedras. Diz que não aguenta mais, que o serviço não o deixa dormir há três dias, e vai beber um café com o colega/enfermeiro ucraniano. Dentro da ambulância, uma Mercedes apenas com luzes médias que rola a 90 Km/h, está um frio insuportável. Uma janela que teima em abrir-se, com a vibração, também não ajuda. O carro de um familiar do José segue, agora, à frente da ambulância. Foi o bombeiro que pediu, para ser guiado e a viagem ser segura, não vá alguém adormecer. Com o Sol já bem-nascido, José chega por fim ao Hospital de Peniche, às 08:00 horas. É rapidamente observado e fica num corredor, à espera de subir para o primeiro piso, onde será internado. Os familiares recebem instruções para partir, com a indicação de telefonarem ao meio-dia, para saber novidades. O contacto é feito. E quase 24 horas depois do AVC, José ainda está no corredor, à espera de ser internado…covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-35891497737178196342006-12-20T18:47:00.000+00:002007-06-09T13:59:01.320+00:00O que não se escreve<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiajPHoK-9-poekBwxI08zCyvchBtgQdzzidlblH1ChdNzIlzoL-KrSZt0fwhxCWS2ICxmuL40_YyBsLDIPwgdz5GS-L0S_wKKeMYy599CFmTSa8GqDsAqv3lr_qmgGcPiqpsvUI5rZ9xAX/s1600-h/IMG_0830.JPG"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5010686726707383570" style="CURSOR: hand" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiajPHoK-9-poekBwxI08zCyvchBtgQdzzidlblH1ChdNzIlzoL-KrSZt0fwhxCWS2ICxmuL40_YyBsLDIPwgdz5GS-L0S_wKKeMYy599CFmTSa8GqDsAqv3lr_qmgGcPiqpsvUI5rZ9xAX/s400/IMG_0830.JPG" border="0" /></a><br /><br /><br /><div align="center"><strong><em>Biarritz, Julho de 2006</em></strong></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-78752695823145572122006-11-26T00:30:00.000+00:002006-11-26T00:35:18.811+00:00Pinga-amor<span style="font-size:130%;"><em>O pinga-amor deixa por onde passa a alegria da sua face, descongela os olhares presos no escuro e aconchega-os com uma felicidade permanente; solta um eco inspirador, cópia dele mesmo, é farol que fura tristezas e inspiração para os desencontrados do sorriso. O pinga-amor deixa-se pingar por todo o lado e só não se desfaz no próprio rasto porque todo ele é fonte de ternuras, de bondades; ajuda a sentenciar desesperos, empurra no salto às melancolias, entrega-se, sempre, nas mais puras paixões. O pinga-amor ama e ensina a amar, é dicionário de sentimentos, mapa aos destinos belos e nunca antes vividos; dá-se na sua imensidão e deve ser lido com a devoção mais profunda. Também ele merece ser pingado.</em></span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-7665977718851539462006-11-20T18:45:00.000+00:002006-11-21T17:49:13.649+00:00Mergulho<span style="font-size:130%;"><em>Assim como o mar entra pelos olhos, também os olhos navegam memória acima para fazer desfilar a força daquelas águas, hoje ternas, em tempos armadilha disfarçada. E à medida que o mergulho é mais e mais fundo, torna-se clara a imagem da tarde em que nada disto era planeado, em que ele, predador e feroz, esperava o momento certo para a fatalidade, para o ataque.<br />A emboscada foi nada mais que breve. Subitamente a onda quase fechada esfumou-se em espuma, com a camada de branco lá por cima a borbulhar fervendo de cinismo, porque se era lençol calmo de novo, também escondia por baixo uma vida que queria libertar-se. No vazio a luta durou menos que tempo; e mesmo antes da primeira tentativa de grito já tudo estava condenado ao silêncio, a uma dormência consciente mas aos poucos leve, e mais leve, até ausente.<br />Do nada uma mão torna-se dona daquele corpo pesado e amolecido, saca-o, devolve-o ao ar que pode inspirar-lhe vida. E espera, suplica por uma reanimação, por um vómito de água que signifique uma batida no coração desistido. E ele bateu.</em></span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-19134101042399662572006-11-13T11:24:00.000+00:002006-11-14T01:51:16.957+00:00Cheiro de vida<span style="font-size:130%;"><em>Cheiro o meu cheiro neste teu corpo triste e cansado de vida, aqui, para mim sempre corpo, existência, e percebo-o agora a embarcar nesse abismo escuro e ausente<br /><br />Cheiro o meu cheiro neste corpo apesar de tudo ainda belo, elegante e sereno, derrotado mas com o orgulho de quem nunca aceitou vergar-se, e atinjo mais do que nunca a evidência de que não sou acaso, eu isolado, eco sem passado<br /><br />Cheiro o meu cheiro, sinto que a minha pele vem da tua, que o meu gesto é cópia do teu; vejo em ti o meu olhar, decifro finalmente todos os traços da tua face e, neste triste fim, uma tímida brisa me refresca</em><br /></span>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-6218567241337401878.post-72004020392640584202006-11-12T01:11:00.000+00:002006-11-20T23:37:46.175+00:00Partida<div align="left"><em><span style="font-size:130%;color:#000099;"></span></em><a href="http://photos1.blogger.com/blogger2/4630/759102446452319/1600/IMG_0436.jpg"><img style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 338px; CURSOR: hand; HEIGHT: 242px; TEXT-ALIGN: center" height="272" alt="" src="http://photos1.blogger.com/blogger2/4630/759102446452319/400/IMG_0436.jpg" width="368" border="0" /></a><br /><br /><span style="font-size:130%;"><em>Também aqui o mar é ponto de partida</em></span></div><div align="left"><em><span style="font-size:130%;"></span></em> </div><div align="left"> </div><div align="left"><span style="font-size:130%;"><em></em></span></div><div align="left"><span style="font-size:130%;"><em></em></span></div><div align="left"><span style="font-size:130%;"><em>Porque no mar não se morre - a água faz apenas o seu papel, invade as nossas profundezas, sufoca todos os espaços para nos libertar para a vida imensa e azul -, o que sonhamos é ser oceano, estar onde as almas se deixam levar pelas correntes, nas mais consentidas derivas<br /><br />E se formos embrulhados e expulsos logo de seguida, apenas uma conclusão: mais respeito na forma de o mergulhar</em></span></div>covadosono@yahoo.comhttp://www.blogger.com/profile/17941318309336706139noreply@blogger.com2